Desde que comecei a trabalhar como tradutora, este foi um tema que sempre me deu “borboletas no estômago ao contrário”, se é que isso existe. É impossível não ficar um pouco nervosa quando você recebe aquele e-mail do revisor do cliente pedindo suas considerações sobre as revisões que ele fez.
Algumas coisas que passam pela minha cabeça em 2 segundos: fiz bobagem, perdi o cliente pra sempre, meu deus esse é aquele trabalho que fiz com enxaqueca, agora minha carreira acabou. Quando consigo respirar, abrir os anexos e ver que são algumas simples correções preferenciais do cliente, nada crítico e ninguém está querendo me eliminar da face da terra porque eu traduzi soft como suave e ele preferia macio, me acalmo e aí vem o que queria discutir neste texto (e você pode se perguntar, se era isso que queria, porque escreveu dois parágrafos antes de começar?)
De qualquer forma, o que eu queria dizer é que isso é muito bom. Descartado o terror inicial, é muito bom receber esse feedback, saber o que o cliente gosta, que palavras ele prefere e até mesmo eventualmente aprender com algum erro seu, ou pensar duas vezes antes de aceitar um trabalho durante uma crise de enxaqueca/ou-outro-fator-debilitante.
Mas não é fácil. De modo geral, o ser humano tem uma relação nada saudável com as críticas. Temos uma dificuldade muito grande em lidar com a crítica como algo objetivo, relativo a algo específico, e não como algo pessoal que ataca todo o nosso trabalho (ou vida, ou aparência, ou seja lá o que for que é criticado naquele momento).
Na verdade, tenho visto algumas linhas de discussão específicas em fóruns de tradutores, exatamente sobre este tema e, inclusive, desautorizando o trabalho dos revisores de seus clientes. Tradutores indignados porque são “obrigados” a usar uma palavra que não acreditam ser a mais adequada àquele contexto. Tradutores revoltados com a nova organização que foi dada à sua frase. Tradutores inconformados com a opinião alheia.
E apesar de eu entender que, em alguns casos, os revisores “in country” dos clientes tem seus próprios vícios de linguagem que querem inserir em nosso trabalho e que isso não é bom, precisamos saber separar as coisas. Nada mais triste, por exemplo, do que ficar quebrando a cabeça para estar evitando o uso do gerúndio do texto original na tradução e o revisor considerar que aquele trecho está errado exatamente porque você não “traduziu o gerúndio”! Sim, existem casos que precisam ser questionados e revertidos, mas em 90% dos casos, são simplesmente ajustes preferenciais que atendem à linguagem interna/desejada de uma empresa (seu cliente, aquele que tem sempre razão) e não ofendem ninguém.
Na verdade, nós tradutores, e nós, seres humanos em geral, precisamos exercitar a humildade. A capacidade de escutar uma sugestão, uma crítica, saber colocar aquilo em contexto, questionar e “se defender” quando necessário, claro, mas sem categorizar toda uma classe profissional como incompetentes.
Sim, eu me orgulho do meu trabalho e sim, eu fico chateada com algumas revisões que não acrescentam nada e alteram meu trabalho que custou tanto de meu tempo e esforço. Mas eu entendo e aceito que são necessárias e fazem parte do mercado.
Vamos todos ser mais Zen, é minha recomendação aos colegas tradutores.
by: Cássia Afini